Quem acompanha o blog já percebeu o quão tendencioso sou em relação aos ciclídeos, pois vira e mexe estou aqui trazendo algum tema envolvendo eles… e hoje não é diferente! Não é pra menos, não é mesmo? Ciclídeos têm um diferencial consigo. Tanto é verdade que os temas não se esgotam com facilidade e muitas espécies são, por si só, o conteúdo de um artigo. Chega de enrolação, vamos conhecer o astro de hoje…

O Acará-Disco ou simplesmente Discus é aquele peixe de formato circular, tipo um CD, e considerável achatamento lateral. Independentemente da espécie adquirida, falamos de um peixe amazônico, o que significa água quente (28º-30ºC)  e ácida (veremos à frente que nem sempre). O nome genérico Disco/Discus engloba (oficialmente) três espécies:Symphysodon discus, S. aequifasciatus e S. tarzoo.

“Três espécies…sei…o Johnny deveria ter pesquisado melhor, aqui na loja da esquina tem trocentos tipos de Discus…”. Tipo assim, você estaria certo ao falar de tipos, mas tipos não são espécies, tipos seriam variedades…tipo assim, vou explicar.

Antes de chegarmos ao que encontramos nas lojas, que são dezenas de distinções comerciais, seria interessante sabermos que há uma discussão sobre quais são as espécies reconhecidas pela ciência. A escolha que fiz se baseou no Fishbase.org, que é onde gosto de consultar, mas além dela pode ser que você ache, ao invés de Symphysodon tarzoo, a designação de S. haraldi, como a terceira espécie; ou ainda artigos com divisões de espécies e subespécies. Óbvio que os taxonomistas não param por aí e outras possibilidades estão postas na mesa. Além de DNA para saber quem é quem, os caras comparam as comunidades que se dividem nas regiões leste, oeste e central da (imensa) bacia amazônica e suas cores selvagens (basicamente: marrom, azul, verde, heckel e abacaxi – estes dois últimos são melhor entendidos se usarmos a palavra fenótipo, que é a “roupa que vestem”, ou seja, padrões de cores característicos); muito parecido com o que é feito no lago Malawi, na África. Quanto a minha escolha, se fôssemos dar “cores” a eles seriam assim: 1) Symphysodon discus (Heckel e Abacaxi), 2) S. aequifasciatus (azul e marrom) e 3) S. tarzoo (verde). Sua distribuição? 1) rio Negro e rio Abacaxis, ambos de águas negras; 2) zonas central e leste da bacia amazônica; e 3) no oeste.

“E por que interessa saber de onde eles vêm? O meu vem da loja e vai para o aquário.” Se fosse só isso estava fácil…se observar bem verá que eu citei “águas negras” para o primeiro. Você lembra das distinções de águas que vimos no artigo de Apistos (gênero Apistogramma)? Caso não, deixe-me lembrar; são três principais tipos de água dos rios amazônicos: “Black Water” (água negra), “White Water” (Água Branca) e “Clear Water” (Água Clara). Abaixo transcrevo o que outrora escrevi:

“Black Water é a água com aquele aspecto de chá mate. Caracteriza-se por possuir ácidos húmicos e fúlvicos e um composto chamado tanino, oriundos da decomposição vegetal; fatores que fazem o pH despencar para a acidez. Cursos d’água com esta denominação são, normalmente, pobres em nutrientes (minerais dissolvidos), com boa transparência e possuem fluxo lento. Todavia, não basta ser escuro para ser Black Water, mas sim ter as características mencionadas; digo isso porque muitas vezes rios escuros podem ter sido tingidos por influência dos sedimentos do leito. Nosso Rio Negro é o maior Black Water do mundo; são também classificados assim o Tefé, Arapiuns (afluente do Tapajós), Vaupés (afluente do Negro) etc.

White Water, por sua vez, indica água rica em nutrientes, com grandes concentrações de matéria dissolvida e em suspensão, tendendo a ser túrbida; pH mais alto, próximo ao neutro. Os rios Purus, Juruá, Japurá e Madeira são exemplos. Mesmo chamando-se “branca”, ela apresenta a cor dos sedimentos/materiais predominantes que estiverem em suspensão. Rios com esta água são responsáveis por até 80% do montante de pesca para consumo humano.

Por fim, Clear Water são águas que têm características mais próximas às negras, com exceção da cor, pois advêm de regiões de drenagem donde não têm muito o que carrear (zonas de baixa erosão).”

Saiba você que os Acarás-Disco vivem em todas essas águas e por isso julgo importante saber a procedência, caso você adquira ou já mantenha discos selvagens. Há um detalhe porém…visto habitarem ambientes de água lenta (lêntico), raramente há material em suspensão em quantidades elevadas; portanto, se for caracterizar a água branca, não se preocupe com sedimentos em suspensão, volte-se para o pH e temperatura.

As variedades de Discus

Quando você vê um Acará-Disco numa loja, normalmente verá junto ao nome denominações como “Pigeon”, “Red Marlboro”, “Blue Diamont”, “Snakeskin” ou “Red Turquesa”, dentre dezenas de outros. Saiba que você está diante de seleções ou misturas de espécies. São tantas nuances e detalhes que eu sequer saberia explicar com exatidão como cada variedade é nomeada, pois além de certos padrões conceituados entre os criadores existem, nos nomes, peculiaridades dadas pelo criador ou por novas convenções. Não se tratam de regras fixas como a taxonomia científica, mas sim de descobertas advindas da criação, as quais aguçam o desejo dos hobbistas. O melhor mesmo, para uma pessoa que não é entendida sobre Acarás-Disco, é decorar o nome do peixe que você comprou.

Por outro lado, e de forma geral, alguma coisa você pode sair daqui sabendo. Se o disco possui o corpo fechado num azul iridescente ele é um “Cobalt Blue” ou “Blue Diamont”, uma manifestação genética recessiva; Pigeon é quando o disco possui aquelas salpicadas de “pimenta do reino” (pontos negros) no corpo; “Red Turquesa”, um dos mais comuns, possui faixas azuis e vermelhas que serpenteiam o corpo; e “Snakeskin” é quando o padrão de manchas lembra a disposição das escamas do réptil. Fácil? Não é não, cada uma dessas pode vir com adendos no nome. Exemplos? Pigeon Blood Marlboro, Pigeon Blue Panda…e que tal Red Spotted Golden Leopard Snakeskins? Por isso repito a dica: guarde o nome do peixe que você comprou (e compre somente de lojistas que possuem selo de confiança, para não ter surpresas no futuro).

Um aquário para Discus

Dicas de como ornamentar um aquário para Discus podem ser baseadas numa análise de seu habitat. Embora bem distribuídos ao longo da bacia amazônica, os Discus frequentam as margens dos rios e as áreas alagadas. Dá pra perceber que se trata de um ambiente constituído por variações sazonais, no que se refere aos parâmetros d’água, disponibilidade de comida, oxigênio dissolvido na água e até no quesito de predadores e parasitas. Na natureza isso teria dois grandes momentos: cheia e seca.

Eles têm comportamento gregário, especialmente quando é época de seca, que é quando se aglomeram em grandes cardumes, reunidos por entre raízes, galhos e vegetação que tomba das margens para a água. Por isso que um dos layouts recomendados são as galhadas, que se baseiam num cenário de diversos galhos/raízes entremeados; pedras e folhas são condizentes com o arranjo. Não é incomum vermos os Discus em aquários com plantas; eles são coloridos e maravilhosos, contrastam com o fundo e não são de arrancar a vegetação. Por chegar a uns 15cm, preferir viver em grupos e locais espaçosos, são aconselháveis aquários grandes.

No aquário, acredito eu, não é necessário que você faça a variação “enchente-seca”. Além disso, salvo seu peixe seja selvagem, com condições mais específicas a serem seguidas, proponho que você mantenha os parâmetros mais confortáveis: água mole, com pH em torno de 6 e temperatura entre 28º-30ºC.

É louvável ressalvar que o Acará-Disco não é um peixe para iniciantes, pois ele requer atenção em muitos aspectos. A despeito do que já foi dito, é certo afirmar que nitritos e amônia precisam estar zerados, assim, os testes são imprescindíveis. Os Discus são muito ativos, gostam de comer, e podem influenciar nas condições da água. O que a grande maioria dos mantenedores recomenda são constantes trocas parciais de água de 20% a cada dois dias. O número de teorias a respeito dessa periodicidade é imenso, entretanto, para você entender basta controlar os parâmetros acima e fazer, ao menos, uma troca semanal.

Por falar em comida, muitos gostam de pensar que ele é um predador nato, porém, não é bem assim. O Acará-Disco requer uma boa base vegetal em sua dieta e existem alertas contra a inclusão de carne vermelha, como fonte de proteína. Em termos aquarísticos, a Spirulina viria como ótimo suplemento vegetal e pequenos invertebrados, como larvas de inseto e crustáceos se adequariam às necessidades proteicas.

Outro cuidado. Por ser um peixe tímido, os companheiros de aquário não podem ser demasiadamente agressivos ou efusivos. Existem muitos casos em que o Discus perde o apetite apenas por não querer competir com peixes muito ativos. Pequenos peixes de cardume como neons, borboletas/machadinhas (Carnegiellaspp.) ou lápis (Nannostomus spp.), corydoras, Ramiresi, apistos e são dicas para compor um aquário comunitário que contenha Acará-Disco. Neste quesito alimentar também cabe apontar para a necessidade de observação quanto ao apetite do Acará-Disco, uma vez que são suscetíveis à parasitas internos; uma das melhores formas de prevenção se dá com a utilização de aditivos na comida, os quais acentuam o sabor e contêm componentes que inibem ou eliminam parasitas.

Reprodução

No ambiente natural, a reprodução ocorre no início do período das cheias – sensação que pode ser induzida com aumento da periodicidade e do percentual das trocas parciais de água. O Acará-Disco alcança a maturidade em cerca de um ano, quando ele procura um único parceiro para aquele período. O casal formado escolhe, limpa e protege um território, normalmente contendo alguma superfície plana, como uma folha larga, uma pedra ou um tronco. Não são fáceis de se visualizar as características de macho e fêmea, por se tratar de uma espécie monomórfica, porém, logo após a desova o oviduto da fêmea fica mais aparente e facilita a identificação. A desova não é posta de uma só vez, ela pode ocorrer em mais de uma etapa.

O mais legal vem agora. Os Discus são conhecidos como um dos poucos ciclídeos (o Uaru spp. também) que produzem um muco nutritivo que serve de alimento para a cria recém-nascida. Muitos chamam isso de “Discus Milk” (leite de disco) e se trata de uma substância crucial para a sobrevivência dos alevinos nos primeiros estágios de vida. Por isso, se você vir os peixinhos beliscando os pais no aquário (parece um enxame ao redor do adulto), saiba que eles estão se alimentando.

Principais Doenças

Os Discus estão suscetíveis à todas as doenças que afligem os peixes de aquário. A maioria está associada à qualidade de água, que como eu adiantei é mais significativa para o Acará-Disco, por ser ele mais sensível que a média. Temos no Blog três artigos que falam especificamente de doenças…aproveita o break e corre ali para dar uma lidinha. Ainda assim, eu destacaria duas enfermidades:

1) Buraco na cabeça: gerada por um protozoário flagelado do gênero Hexamita que atua no sistema digestivo. Começa com desnutrição do peixe, perda de peso e a primeira grande marca, que é a que dá nome à doença: uma mancha escura na cabeça. Com a evolução, há o escurecimento do peixe, ele nada com a cabeça baixa e também adquire o hábito de nadar para trás; notam-se orifícios nos locais afetados e o peixe parece murchar. Especialmente na cabeça, será observado algo parecido com pus, dentro do buraco.

2) Parasitas internos: é impressionante o número de casos que afetam os discos. Normalmente os sintomas se dão com a perda de apetite, enegrecimento das cores e emagrecimento. Sua origem pode advir até mesmo de outros peixes colocados no aquário. O tratamento é feito com medicamento próprio para parasitas.

O conteúdo sobre o Acará-Disco é vasto e minucioso, pois ele é conhecido e adorado mundialmente por sua graça, comportamento e cores…este é realmente um peixe que enche os olhos do aquarista e, caso você opte por ter um, não deixe de pesquisar a fundo sobre como mantê-lo.

As ideias chegam, o tempo passa e as páginas acabam…e por isso preciso encaminhar para o fim de mais um artigo…espero que os Discus tenham conquistado mais um admirador.

Agradeço pela leitura e aguardo você no próximo artigo. Até lá!

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