Destinei um artiguinho para falar dos peixes malcomportados. Quem nunca viu um daqueles peixes antissociais, superagressivo ou extremamente mal-educado? Não estou falando apenas de peixes mal-humorados não, falo daqueles que a agressividade tem o poder de matar outro ou danificá-lo em vários níveis de gravidade.

Dentre os peixes tradicionalmente mantidos em aquário, acredito que sejam os ciclídeos os detentores da maioria das reclamações, pois está em sua natureza a agressividade…e é sobre essa condição que resolvi bolar o texto, mostrando aspectos de algo que muitos consideram simplesmente “ruim”.

Antes de mais nada, preciso afirmar que sou contra atribuir adjetivos do tipo “mau” ou “bom” aos peixes. É necessário entender que eles possuem comportamentos distintos, muito além desse tipo de definição, assim, é relativo falar de má fama de um peixe…ele não tem culpa de ser assim!

Como veremos adiante, o detalhe que pode nos fazer xingá-lo e praguejá-lo pelas próximas encarnações, provavelmente se trata de algum quesito natural (ex: tamanho) ou provocado por alguma condição (ex: estresse).

Ciclídeos agressivos

Numa família enorme como é a Cichlidae, agressividade não é uma característica incomum, pelo contrário, ela é presente em todas as espécies, em níveis completamente distintos. Nela encontramos desde os minúsculos e mansos Brevis, conchícolas endêmicos do lago Tanganiyka, até os vorazes predadores de peixes da América do Sul, como os Tucunarés. Cada espécie é um universo completamente diferente de outra.

A importância de conhecer as espécies reside justamente na possibilidade de elaborar uma combinação de espécies, que resultam no sucesso ou desastre completo de um aquário. “Por que o Johnny mudou de assunto? Ele estava falando de agressividade e mudou para combinação de espécies.”Quero, na verdade, é começar a relativizar o quesito agressividade, mostrando que ele possui mais de uma forma de ser visto.

Imagino eu que os hobbistas que possuam alguma expertise nos Ciclídeos Jumbo Centro-Americanos, por exemplo, não os considerem agressivos nos níveis que outros tipos de hobbista poderiam considerar. Isso porque ao estudarem os comportamentos das espécies, considerando os tamanhos, hábitos alimentares e experiências de outros aquaristas, foram capazes de compor uma população compatível. Esta é uma das vertentes que auxilia no controle ou, ao menos, na compatibilização da agressividade.

É fato que a criação das condições de um aquário, interfere diretamente na agressividade cotidiana e também nos rompantes de hostilidade. Dessa forma, é de suma importância a observação de detalhes como: tamanho dos indivíduos e do aquário, compatibilidade entre espécie, parâmetros da água, alimentação adequada… “Mas Johnny, peraí, não é possível eliminar a agressividade de um indivíduo?”

Agressividade não se trata de um distúrbio comportamental dos animais, mas sim deriva de um instinto pela sobrevivência. A competição ferrenha sobre os alimentos, a proteção da prole ou defesa de território, certamente foram cruciais para que certas espécies se sobressaíssem sobre outras durante o andar da evolução. Agressividade é, dessa forma, algo digno de se respeitar.

Muitos interpretam como agressividade o fato do peixe ser piscívoro, ou seja, ter seu cardápio com base em peixes vivos (é assim que eles encontram seu alimento na natureza: vivo). Existe um abismo de diferença entre agressividade e seu hábito alimentar; uma coisa é o peixe capturar outro com toda sua desenvoltura, estratégia e vigor, visando garantir o almoço, outra, completamente diferente, é ver os indivíduos se agredirem ao disputar a comida, mesmo ela sendo bits ou pellets de ração…esta segunda parte envolve agressividade. Tanto é verdade que um peixe poder ser ultra agressivo sem ser predador, vide alguns exemplos de mbunas do Malawi tipicamente forrageiros, como o Labeotropheus, várias espécies de Maylandia ou Pseudotropheus e por aí vai.

“É possível identificar peixes agressivos? É possível amenizar o comportamento agressivo?” Sim para as duas, deixando claro que não falamos de um “mal que se cura”.

Muitos distintivos podem ser observados: coloração, tamanho ou montar guarda em posições estratégicas (normalmente posições com boa visibilidade e com disponibilidade de alimento). Se formos pensar em cores, e tomarmos um mbuna ou um hap como exemplo – ambos são grupos de ciclídeos do lago Malawi – possuir e manter uma cor em evidência mostra, entre outros, “olhem como sou agressivo”. Um super-alfa ou superdominante – que pode sim ser substituído por superagressivo – transmite por meio da cor que ostenta seu status de bem-sucedido: um peixe que é capaz de conseguir comida de qualidade e em quantidade suficiente, além do vigor infindável para afastar oponentes a todo momento, garantindo seu território e tornando-se desejável pelas fêmeas que o observam exigentemente. Não é fácil ser o bonitão entre os CAs do Malawi. Para estes exemplos, cor é um alerta para você ter noção sobre agressividade.

A palavra “superagressivo” foi usada de propósito para criarmos nuances de hostilidade. Boa parte dos peixes que mencionei situa-se na classificação “ciclídeo anão”, cujo tamanho não varia muito além dos 12 ou 13 cm. Todavia, sabemos que existem ciclídeos bem maiores. O tipo de aquário que já citei anteriormente, o de Ciclídeos Jumbo, nos traz uma nova percepção: um peixe maior é potencialmente mais hábil de causar danos maiores…e eles sabem disso. O tamanho de um peixe é utilizado para criar nos outros a impressão de que é mais poderoso, por isso é tão importante compor uma comunidade cujo tamanhos sejam equiparáveis, no intuito de evitar injúrias físicas sérias nos mais fracos.

No aquário de Ciclídeos Jumbo Centro-americanos, a agressividade não pode ser comparada a maioria dos ciclídeos de aquário, visto que se encontra num patamar muito maior, cujos resultados podem implicar em ferimentos ou morte nos peixes que não estão “habituados” a tal ambiente. Postos lado a lado, para comparar níveis de agressividade, os mbunas e haps deveriam ser considerados “medianos”, enquanto que os grandões tenderiam para “superagressivo”. Esta é mais uma relativização que eu queria apontar.

A última observação que gostaria de inserir aqui para falar de formas de amenizar a agressão é referente a presença de fêmeas. Como bons conhecedores de ciclídeos que somos, sabemos que a época de reprodução é um período em que os reprodutores tendem a exacerbar o comportamento hostil. É por este “detalhe” que muitos aquaristas optam por ter aquários apenas de machos – muito comum com mbunas, haps e aulonocaras – visto que os verdadeiramente coloridos são eles, e não elas. “E nos casos onde as fêmeas são as coloridas e é por elas que a espécie é uma das minhas preferidas?” Ficou na cara que a pergunta é voltada a mim mesmo. Sim, é só para eu falar de duas das mais lindas espécies de ciclídeos centro-americanos: Salvini (Trichromis salvini) e o Curve-Bar (Nosferatu labridens). Os tons de amarelo que as fêmeas adquirem durante os períodos reprodutivos saltam aos olhos. “O que fazer? Também quero!” Dicas: aquário grande, biótopo, com reduzida população (compatível), dedicando-se ao layout que promova territórios bem definidos.

Haverá agressividade? Sim, certamente. Haverá mortes? Depende, você montou com consciência e algumas técnicas? Sim? Então ninguém morrerá, seja feliz! Agressividade não é um defeito, propriamente dito, e sim uma característica, tanto que o fato de serem mais durões que outros peixes, inclusive, atrai certos tipos de aquaristas.

Os Estigmas

Não fosse bastante o fato da agressividade ser mal interpretada, ainda precisamos lidar com alguns nomes comerciais que nada cooperam. O que um iniciante pensaria ao ver na vitrine Green Terror (tradução do inglês: Terror Verde), Red Devil (tradução do inglês: Diabo Vermelho) ou Black Nasty(cuja tradução do inglês seria pejorativa demais, sendo que para o nosso artigo podemos traduzi-la apenas como “desprezível”)? Algo do tipo: “este peixe deve ser um assassino, um monstro!” Pelo que estamos vendo, parece bem injusto, não?

Outros nomes, sem o sentido depreciativo, trazem consigo significados que indicam a agressividade exacerbada: Blackbelt (tradução do inglês: faixa preta) ou Jack Dempsey (nome de um excepcional boxeador americano, que deteve o título de campeão mundial dos pesos-pesados entre 1919 e 1926). Esses até acho engraçadinhos, mas ainda são capazes de dar aos peixes imagens que só serão verdadeiras se o aquário for montado errado. “Este peixe é um grande lutador!”. OK. “Este peixe vai sair espancando todo mundo!”. Nada OK.

E você acha que são apenas os nomes comerciais que trazem o medo junto deles? Que tal avaliar os nomes científicos: Nosferatu labridens ou Nosferatu bartoni. Para aqueles que são meio nerds, tipo eu, e reconhecem certas “deixas”, percebeu que o próprio nome científico do peixe, se refere a um dos mais marcantes vampiros do cinema, cujo nome virou sinônimo desse morto-vivo? O nome foi dado devido a duas destacadas presas localizadas na mandíbula superior do peixe. E ambas as espécies são magníficas, nada assustadoras.

No lado oposto dessa tendência, nomes atenuantes também podem vir a conferir erros de interpretação por pessoas leigas no assunto, ocasionando desespero e decepção com o passar dos tempos. Um dos casos mais famosos é a Zebrinha (Tilapia buttikoferi), peixinho lindinho vendido inocentemente. Trata-se de uma tilápia africana que fica enorme e cuja agressividade pode ser associada aos mais tensos ciclídeos jumbo.

Consegue visualizar a importância de se informar sobre cada peixe?

As listas dos mais agressivos

Andei fuçando na internet as pessoas que se arriscaram a elencar listas de agressividade em peixes de aquário, tanto no geral como nos ciclídeos apenas. Observei que raramente há coincidência entre listas – possivelmente corte/cola – e nenhuma unanimidade. Numa delas o cara claramente põe a questão da predação (peixes piscívoros) como fatores para ranquear a agressividade; comparou aruanã, oscar, snakehead até chegar na piranha de papo-vermelho. Achei muito pobre a abordagem.

Não caia no golpe da lista, pois como já falamos aqui agressividade é relativa e se o aquarista está consciente não há nada que temer. Ainda, para aqueles que gostam ou os curiosos, arrisquei nessa senda. Pensei: “Se eu fosse idealizar uma lista, um tipo de termômetro de agressividade, como isso poderia ser feito?” Você já elencou a agressividade de ciclídeos? Eu não, mas se fosse pensar a respeito, faria considerando agrupamentos e não espécies (não sou louco de enumerar – com elevadas chances de erro – quase 2.000 espécies)…ela seria mais ou menos assim:

Minha lista não é para você aceitar goela abaixo não, a ideia é trazer a dúvida e o raciocínio apenas…agressividade pode ser aumentada ou diluída, dependendo de como está feito o aquário; ela brota, por vezes, em espécies pacíficas; com fêmeas “na parada” a macheza da moçada se eleva e as broncas começam…isso só pra lembrar que a agressividade é uma característica de nuances.

E assim são esses “meliantes”, animais que receberam uma má reputação devido aos donos terem vivido uma experiência ruim ou prejuízo – normalmente de ordem financeira…e tudo isto associado à falta de informação ou aos testes inconsequentes ou aos maus tratos. Por isso, prezo por levar a frente detalhes, curiosidades e conhecimento sobre os peixes de aquário…os agressivos podem ser apenas peixes magníficos à espera de respeito.

Agradeço a leitura e os aguardo no próximo artigo, até lá!

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